Esporte
Mancini: "Se não há combustível, você tem que convencer as pessoas a remar"
por Martín Fernandez
Vágner Mancini hoje é um sujeito tão angustiado quanto otimista, por mais que pareça uma contradição. O técnico do Botafogo tem a difícil missão de salvar o time do rebaixamento no Campeonato Brasileiro, apesar de todas as dificuldades que o próprio clube impõe a seu trabalho - salários atrasados, afastamento de jogadores importantes, dívidas que ameaçam até as poucas chances que ainda existem de permanência na Série A em 2015. Na manhã desta segunda-feira, Mancini falou ao blog.
Por que o Botafogo toma tantos cartões vermelhos?
Quem vive no futebol tem que ter um aspecto emocional muito forte. Quando você se depara com uma situação como essa, num clube como o o Botafogo, que não está acostumado a estar na parte debaixo da tabela, você tem que se renovar a cada dia, passar por cima das dificuldades. E alguns mostram mais dificuldades do que outros. Espero que à base de muita conversa, a gente consiga fazer com que nos últimos jogos não tenha mais esse problema, que possa vencer partidas e vencer as partidas para escapar do rebaixamento.
O afastamento dos quatro jogadores colaborou para essa situação de tensão?
Eu acredito que não. A fase mesmo, a posição na tabela é que está pesando. O fardo está todo dia mais pesado. Alguns reagem de uma forma, alguns de outra. A saída dos quatro incomodou a todo mundo na época, óbvio. Mas a gente sentou, falou sobre isso, o grupo falou sobre isso, absolveu a saída. E a gente entendeu que tinha que dar um pouco mais de cada um, até pelos quatro, que fazem parte da nossa família, eu não acredito que esse seja o ponto.
Mas quando você olha para o time em campo, ou para o banco, não sente falta desses jogadores?
Eu procuro não lamentar. A realidade tem que ser vivida intensamente. Se eu ficar apegado ao que aconteceu ao longo do tempo, vou elaborar uma grande lista de dificuldades. Eu tenho que olhar para frente, pensar nas soluções.
Como está a situação de atrasos no salários?
O que eu posso falar é que estamos com alguns meses de salários atrasados e não há perspectiva para que seja solucionado. O clube passa por uma eleição no final do mês, outras pessoas vão entrar e não sabemos... Sinceramente, estamos focados no que fazer dentro de campo para fugir do rebaixamento.
Qual é sua expectativa profissional para o ano que vem?
É uma pergunta difícil de ser respondida. Vai entrar uma nova diretoria e não quero entrar no âmbito de quem nem assumiu o clube. É um direito de quem assumir. Todo técnico quer a continuidade do trabalho, mas a gente tem que respeitar a vontade de quem entrar.
É a situação mais difícil pela qual já passou?
É. Porque não é somente ir para campo, dar treino, escalar a equipe. A gente teve que resolver uma série de situações. Diariamente nós temos que brigar contra diversas adversidades, e isso vai desgastando e tirando energia do grupo. A gente tem que fazer pequenas cirurgias ao longo do processo. Felizmente o Botafogo só está de pé por causa disso, se não a situação seria muito pior. Nesses últimos cinco jogos que faltam a gente tem que lutar muito e botar força interior de cada um para que consiga reverter o quadro.
Pode contar alguma dessas cirurgias que você teve que fazer?
É que nem um navio que está em alto mar, e você tem que ir fazendo adequações, fechando buracos para que o navio não afunde. Algumas pessoas saíram ao longo do processo, o que foi dificultando. A falta de dinheiro atrapalha. Se você não tem dinheiro para comprar combustível, você tem que remar. E convencer as pessoas a fazerem isso. Você tem que sentar, falar a verdade, fazer os jogadores entenderem que embora a gente tenha direito de reclamar dos atrasados, temos a nossa família, gente que nos olha como exemplo. De alguma maneira tínhamos que ter um foco para nos manter de pé.
E como você reagiu ao caso Elkeson?
Foi uma bomba. Porque, imagina, a gente numa situação dessa, lutando por cada ponto, e a gora pode perder mais seis. Mas a diretoria me tranquilizou que até quinta-feira o pagamento vai ser feito, só não me pergunte como. A minha alegria foi grande de saber que o Botafogo ainda só depende dele.
Você tirou alguma lição deste ano difícil?
A parte de gestão de pessoas eu fiz pós-graduação, mestrado, MBA, doutorado e hoje sou PhD. Tive que conviver com muita coisa a cada dia, uma surpresa diferente, desgaste com diretoria, jogadores. Administrar tudo isso e ainda ter que somar pontos no domingo, sendo cobrado como a gente é. Eu acho que isso fez com que eu amadurecesse muito no comando do time.
Teve que pagar alguma coisa do bolso?
Todo mundo fez alguma coisa. Teve ajuda de atleta para atleta, de técnico para funcionário, de integrante da comissão técnica para outro, isso sempre aconteceu. Cesta básica para funcionário... A gente tentou criar um ambiente favorável e todo mundo entendeu que dando as mãos seria mais fácil para sair.
FONTE:
http://globoesporte.globo.com/blogs/especial-blog/bastidores-fc/post/mancini-se-nao-ha-combustivel-voce-tem-que-convencer-pessoas-remar.html
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