Juninho brinca com a bola oval no Central Park: vida nova nos EUA (Foto: Gustavo Rotstein)
Em pouco mais de dois meses, Juninho sentiu o que é ser mais um morador de Nova York. Sem o assédio do público, é pouco reconhecido nas ruas e caminha quase que anônimo ao lado da mulher Renata e das filhas Giovanna, Maria Clara e Rafaela. Em seu clube, apesar da condição de astro, não conta com o mesmo status salarial do atacante francês Thierry Henry e do meia australiano Tim Cahill. Mas para ele, após 20 anos de dedicação quase que exclusiva ao trabalho, aquela que pode ser sua última temporada como jogador profissional é também o momento de dividir a obrigação com a diversão.
O GLOBOESPORTE.COM esteve com Juninho em Nova York e acompanhou sua nova rotina. Ele divide o tempo entre treinos e jogos com as tarefas paternas – como levar as filhas ao colégio a pé – e a diversão – como passear no Central Park e assistir a musicais na Broadway. O idioma não é problema. Sempre ajudado pelas filhas, ele se vira com o que aprendeu em poucas aulas quando jogava no Catar.
- No inglês eu me defendo - brinca.
Mesmo de longe, não deixa de acompanhar o Vasco, mas prefere sempre pensar muito e escolher bem as palavras quando se refere ao clube. Vibrou com a contratação de Paulo Autuori e mostra confiança em dias melhores. Até porque prefere nunca descartar um retorno, embora pense não ser o momento de falar sobre o assunto. Ao analisar o clube, lembra que o conturbado ambiente que contribuiu para sua saída é algo mínimo se comparado ao prazer por ser um dos principais nomes da história de São Januário.
O New York RB começou a temporada ainda sem vencer. Em quatro partidas (sendo que três fora de casa), foram duas derrotas e dois empates. Juninho ficou fora do compromisso pela segunda rodada por causa de dores na panturrilha e, por conta disso, entrou no segundo tempo do único jogo disputado no Red Bull Arena.
GLOBOESPORTE.COM - Após dois meses, qual a análise que faz da liga americana de futebol? É algo diferente do que você esperava?
JUNINHO - Não coloquei muita expectativa. Acompanhava algumas coisas e sabia que havia muito investimento, principalmente desde a chegada do Beckham e depois com outros jogadores de nome. Mas sabia que não era uma liga considerada superimportante. Achei uma competição com jogadores muito bem preparados fisicamente, pois o americano é muito voltado para isso. Muita gente dizia que aqui as pessoas não frequentavam os jogos, mas até agora vi os estádios quase completos, com um público bem participativo e uma festa bonita. A parte técnica não é brilhante como a nossa, mas tem coisas boas. Mesmo assim, também não foi por ser um grande liga ou não que escolhi vir.
Então por que decidiu defender o New York RB?
Quando acabou meu contrato no Qatar, em 2011, tinha oferta para renovar por dois anos. Mas quis voltar para o Vasco fazendo um contrato de seis meses e depois veria o que eu faria. Acabei ficando um ano e meio. Em outubro do ano passado houve o primeiro contato do clube americano, que me ofereceu um contrato de dois anos, mas sem os ganhos acima do teto estabelecido pela liga. Eu viria com um contrato de jogador local, um pouco maior. Conversei com muita gente e vim aqui em dezembro. Aos 38 anos, achei que seria uma oportunidade familiar que eu não poderia deixar passar. Já estou apaixonado pela cidade, morar aqui é muito fácil. Com essa qualidade de vida é mais fácil adaptar. Minhas filhas estão felizes, e sei que essa escolha vai contar para o resto da vida delas.
O que encontrou de especial em Nova York? Tem conseguido aproveitar o que a cidade oferece?
Juninho com as filhas na Times Square, centro
turístico de Nova York (Foto: Gustavo Rotstein)
turístico de Nova York (Foto: Gustavo Rotstein)
Você é anônimo em Nova York?
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Só me pararam nas ruas no máximo umas cinco vezes. Foram dois franceses, um grego e um argentino. O argentino me desejou boa sorte e eu cruzei os dedos, porque sorte de hermano... sei lá (risos). Mas aqui eu sou totalmente anônimo.- Galeria de fotos: Juninho em Nova York
Sentia falta dessa privacidade?
O que sempre me incomodou é que eu nunca fui um jogador fora de campo. Não é o assédio que me incomoda. Falta de privacidade é um termo muito forte. Sei lá... Viver 24 horas como um personagem, um jogador, isso me incomoda. Acabou o jogo ou o treino, quero ir para casa. Sou um ser humano com direitos e deveres, então essa relação sempre foi muito difícil para mim. Sempre guardei uma distância. Mas é claro que gosto de ter uma relação com o torcedor, quando existe respeito. Não me incomoda fazer uma foto, mas às vezes existem alguns que passam do limite, então não aceito. Mas não tenho o que reclamar da torcida do Vasco. Em um ano e meio foi só agradecimento.
Então, com esse bom ambiente, pensa em estender sua permanência nos Estados Unidos, ou voltar para o Brasil está nos seus planos?
Juninho joga com neve pelo New York RB: novo desafio profissional (Foto: Gustavo Rotstein)
E jogar novamente no Brasil? Existe a possibilidade?
Muitas pessoas me falaram para jogar o estadual no ano que vem. Mas se eu digo para você que vou fazer, já se cria uma expectativa. Então prefiro não dizer nem que sim, nem que não. Vamos deixar o tempo passar. Se no fim deste ano eu estiver me sentindo bem, jogo mais um pouco. Se não estiver bem, eu fecho a temporada da melhor maneira aqui e volto para o Brasil.
Você voltaria a trabalhar no Vasco, mesmo fora de campo?
Não sei. Só vou se... (pausa). Hoje eu digo que conheço o Vasco. Na minha primeira passagem eu era muito novo.
É possível dizer que você conheceu mais o Vasco em um ano e meio do que nos cinco anos e meio da sua primeira passagem?
Sim. Lógico que em 1995 cheguei ainda buscando meu lugar. Agora tenho outra vivência de futebol.
Quando você deixou o New York RB, falou sobre sua insatisfação no Vasco.
Quando veio conhecer o clube, em dezembro, já voltou ao Brasil decidido a não permanecer em São Januário?
Juninho em disputa de bola: liga na qual a questão física é importante (Foto: Getty Images)
E fora de campo?
A única coisa que lamento é que poderia ter ajudado mais os treinadores. Mas o pouco que fizesse, criariam um disse me disse em cima. Minha liderança foi única e exclusivamente técnica. Não foi muito de vestiário porque não fluiu naturalmente. Como já tinha reconhecimento grande e tinha certo ambiente político que entrava no vestiário, então evitava ao máximo. Cobrava da diretoria, mas poderia estar mais próximo da comissão técnica. O Henry faz isso aqui. Eu fiz o mínimo possível, poderia ter ajudado mais, mas o ambiente não deixava.
Mesmo com toda essa vivência, você pode dizer que essa nova etapa da sua carreira é um aprendizado?
Claro. Ainda estou aprendendo coisas novas. Somente assim vou poder passar alguma coisa quando parar. A turma dos velhinhos tem eu, Rogério Ceni, Zé Roberto, Marcos Assunção, Deco, Gilberto Silva, Cris... Quem estiver nos 35 anos está no nosso grupo (risos). Temos uma característica de possuir algo mais de dentro. Não se pode só confiar no talento. Não dá para chegar numa liga como essa dos Estados Unidos, que dizem que é fraca, e não estar em forma. Porque vai ser atropelado.
Mas você já tem planos sobre o que pretende fazer quando se aposentar?
Quero estar próximo do futebol. Estar mais perto do futebol é mais gostoso. Gostaria de sentir o cheiro da grama...
Mas aguentaria novamente essa pressão do futebol, mesmo como dirigente ou técnico?
Eu aguento, mas não em seguida. Pressão tem que sentir sempre, mas a pressão sadia, normal. Essa não me incomoda. Mas logo em seguida talvez eu não terei esse algo mais que tenho como jogador. Talvez eu precise de um pouco de tempo para aproveitar a aposentadoria. Mas quero estar perto do futebol. Gosto de falar sobre futebol, passar alguma coisa.
Pensou exatamente onde você poderia se inserir nesse contexto?
A grande mudança no futebol brasileiro tem que ser na base. É igual à educação em casa. Quando você ensina o melhor para os filhos, maior a probabilidade é de eles fazerem as melhores escolhas. Por exemplo, no Brasil, desde criança a gente aprende que cavar falta é ser malandro. Quando cheguei à França eu cavava falta também, só que eu levei vaia e os adversários vinham para cima de mim. Mas me policiei e parei. No Brasil a gente aprende que ser malandro é legal, mas não é. Cavar pênalti é antijogo. Esse estilo de parar muito os jogos faz o Brasil não atrair tantos olhares como poderia. É lindo o nosso jogo, mas para tanto que às vezes é chato. Então isso tem que começar de baixo para cima. Acho que a base tem que ser unificada, e a CBF tem precisa ter um controle maior e formar ligas mais fortes. Talvez pudesse haver um acompanhamento maior. Mas desde cedo existe uma pressão por resultados.
Acha que poderia, então, fazer um bom trabalho nas categorias de base?
Se eu tivesse tempo para passar o que aprendi de bom, implementar uma filosofia, eu gostaria de trabalhar na base, sim. Acho que faria um bom trabalho. Desde que tivesse tempo. Mas, olha, não estou cavando. Um jogador de 18, 19 anos precisa saber se posicionar em campo. Por exemplo, os garotos que subiram no Vasco no ano passado têm muito talento, mas taticamente eram fracos. E eu os ajudei muito. Infelizmente a diferença cultural em relação ao jogador estrangeiro é muito grande. Aqui no meu time tem dois jogadores que acabaram de se formar na universidade. Um recebeu uma proposta da Samsung e pensou em aceitar, mas acabou ficando no futebol. Então, se a formação dos nossos jogadores puder ser comandada como é o futebol profissional, será melhor. Mas claro que nós temos grandes jogadores. Poucos apostam que o Brasil vai ser campeão em 2014, mas em 94 e 2002 a Seleção saiu sem confiança e conquistou o título. Em 2006 o Brasil era favorito e jogou bem.
Já que falou de Vasco novamente, tem acompanhado a equipe? Está preocupado com a temporada?
Não tenho acompanhado muito, só assisti aos jogos contra Duque de Caxias e Botafogo. Não posso fazer uma análise. Mas pelo que vi, se foi da euforia ao fundo do poço muito rapidamente. Era o melhor time do Rio e depois da final da Taça Guanabara disseram que era mesmo a quarta força. Vi coisas boas. A melhor característica foi o coração. O Vasco venceu alguns jogos na raça. Sobre estar preocupado... (pausa). Quero jogar aqui... Mandei mensagem para o René Simões no início do ano desejando sorte. Se o Vasco precisar de alguma ajuda de alguma forma, de repente referências sobre um jogador... faço sem problema algum. O clube está se reestruturando para ser do tamanho do Vasco. Por isso é preciso paciência.
Mas a contratação de Paulo Autuori é uma esperança?
Não tinha ninguém melhor neste momento para assumir o Vasco. Nunca ouvi ninguém falar mal do Autuori. Espero que ele consiga fazer um trabalho a longo prazo. É um grande treinador e líder.
Ao relembrar sua carreira, acha que faltou alguma coisa ou sente-se totalmente realizado?
Em qualquer história do Vasco eu vou estar dentro, mesma coisa no Lyon. Isso me conforta"
Juninho
Existiu a chance de você disputar a Copa do Mundo de 2002, da qual o Brasil foi campeão...
Eu ia para a Copa de 2002, mas aquela parada me prejudicou porque entrei na Justiça. Saí do Vasco em janeiro e só fui estrear pelo Lyon em 27 de julho de 2001. Naquele meio tempo houve as eliminatórias, e o Felipão definiu o grupo. Quando fui à Copa América eu estava há seis meses sem jogar e fui muito mal. Então o Felipão fechou o grupo ali. Era para eu ir. Mas, novamente, quando vejo, era a minha história. Também nunca imaginei chegar no Lyon e ser campeão nacional sete vezes seguidas. Não posso reclamar em relação a títulos. Na minha carreira profissional, somente em 1996 e 2012 não ganhei nada. Espero que neste ano, aqui nos Estados Unidos, eu volte a viver esses grandes momentos.