Comum é uma palavra que jamais pode se aplicar a Hernanes. O volante - que também faz as vezes de meia, já foi lateral dos dois lados, e até atacante - é uma das figuras mais raras do meio do futebol. Com frases curiosas, profundas, quase enigmáticas, que lhe renderam o apelido de Profeta, e a parceria de um cientista para desenvolver seu jogo, o camisa 8 do Lazio tem em comum com a maioria dos brasileiros o amor pela bola. Amor mesmo, a ponto de terem dividido a cama durante a infância do atleta.
Durante seus cinco anos como profissional do São Paulo, Hernanes teve muitos parceiros, mas nenhum mais inseparável do que a bola. Andava para todos os cantos do extenso centro de treinamento do clube sempre acompanhado do objeto. Ou nas mãos, ou com ela passeando em seus ombros, fazendo embaixadinhas... Um hábito que vem desde criança, quando começou a treinar futsal no Unibol.
- Eu ia de casa até o ponto de ônibus driblando os postes, fazendo tabelas com os muros, batendo a bola. Nunca percebi se alguém ficava olhando porque estava concentrado, mas sei que nunca me abordaram - lembra o Profeta, que jamais perdeu uma bola por falta de controle nas andanças pelas ruas de Recife.
- Sempre fui um cara que, em campo, gostava de tocar na bola, participar de todas as jogadas. Quando toco nela, me faz bem.
Hernanes viveu até os cinco anos de idade num engenho de São Lourenço, cidade do interior de Pernambuco. Pisava a cana de açúcar descalço e chutava bolas insistentemente jogadas pelo pai. No pé direito, depois no esquerdo, no direito, no esquerdo... O fato de ser ambidestro, raridade no futebol atual, principalmente no Brasil, é atribuído, em grande parte, ao treinamento totalmente amador aplicado em meio à cana.
Na infância simples do atual meia do Lazio, jamais faltou bola. O pai não podia ver um lançamento na televisão, que investia. Um investimento certeiro. Uma confiança que nem Hernanes sabe explicar de onde vem, mas que originou sua paixão pelo objeto redondo. Tanto que em 2000 viajou para a capital paulista com Geilson, pai de dois amigos que fariam testes em clubes de futebol. Eles não passaram, mas o teimoso Hernanes, depois de reprovações em Corinthians, Palmeiras, Portuguesa e Santos, recebeu sinal positivo no São Paulo.
Hernanes tem se firmado na Seleção de Luiz
Felipe Scolari (Foto: Wander Roberto/VIPCOMM)
Felipe Scolari (Foto: Wander Roberto/VIPCOMM)
- Foi a fase mais difícil da minha carreira porque tinha muita dificuldade para jogar. No futsal as coisas aconteciam espontaneamente, davam certo. Então, comecei a desenvolver um trabalho de concentração e exercícios para aprimorar minha técnica e ficar mais forte fisicamente. Precisava pensar e descobrir uma nova maneira.
A prática deu tanto gosto a Hernanes que, em 2008, ele passou a contar com a ajuda do amigo J. Alves, um cientista que estuda o futebol e lhe ensina técnicas para desenvolver seus fundamentos. Coincidência ou não, naquele ano Hernanes foi eleito melhor jogador do Campeonato Brasileiro, no terceiro título consecutivo do São Paulo: as finalizações com as duas pernas, as largas passadas e os desarmes com movimentos de capoeira surgiram em campo e chamaram atenção. Na verdade, ele só passou a utilizar na profissão o que já trazia da infância.
- Jogava capoeira nas ruas. Eu já havia escutado falar do método desse cientista, e tentava executar, até que começamos a trabalhar juntos.
Na Itália, Hernanes abandonou um pouco a bola. Não porque se cansou dela, mas por ter decidido apostar na parte física, essencial para o sucesso de um brasileiro na Europa. O trabalho com o cientista ainda segue em prática. O motivo? O volante/meia acha que ainda não atingiu seu máximo. Sorte da Seleção...
- Vamos continuar até eu atingir o que imagino que posso. Acho que no máximo mais um ou dois anos. E depois teremos o trabalho de manter.
FONTE:
http://globoesporte.globo.com/futebol/copa-das-confederacoes/noticia/2013/06/brasilidades-hernanes-vai-do-amor-pela-bola-ciencia-no-futebol.html